O bom velhinho e os diminutivos

Thaís Nicoleti

Embora nem as crianças acreditem mais na sua existência, a figura do Papai Noel continua fazendo parte do Natal – quando não explorada pelo comércio, está presente nos ambientes mais festivos, nos quais alguém se dispõe a trajar-se como o tal bom velhinho que distribui presentes. Vale tudo em nome da alegria!

Não vamos, porém, tratar aqui do Papai Noel em si. É a sua alcunha o que nos interessa para uma breve reflexão sobre o uso dos diminutivos em português. A terminação “-inho” é o sufixo de diminutivo mais comum na língua e, no Brasil, empregado em muitas situações, com sentidos que nem sempre indicam “redução de tamanho”.

É bom que se diga, logo de saída, que o grau diminutivo é próprio dos substantivos (uma caixa pequena é uma caixinha, um sapato pequeno é um sapatinho, um prato pequeno é um pratinho – e assim por diante). “Velho” normalmente não é um substantivo, mas um adjetivo. Se dissermos, por exemplo, algo como “Era uma casa velhinha”, estaremos intensificando o atributo “velho”, ou seja, estaremos dizendo que era uma casa “muito velha”.

No caso do Papai Noel, apelidado de “bom velhinho”, temos a substantivação do adjetivo “velho” (“o velhinho”), mas nem por isso o sufixo exprime “tamanho reduzido”. A ideia que prevalece é antes a de carinho para com a pessoa. Quantas vezes não ouvimos expressões como “uma senhorinha muito doce”, “uma criancinha de colo”, “uma mocinha gentil”, sempre adornadas do sufixo de diminutivo para exprimir gentileza?

Vale lembrar que o maior artista brasileiro do período colonial, o escultor Antônio Francisco Lisboa, passou à história conhecido por seu apelido, um diminutivo carinhoso (Aleijadinho) que hoje soaria inadequado ou politicamente incorreto. Termos como “aleijado” ou “aleijão”, hoje de conotação negativa, têm a mesma origem de “lesão”.

Coisa irritante, não carinhosa, deve ser para um anão ser chamado de “anãozinho”, o que, aliás, muita gente faz sem se dar conta de que o fato de uma pessoa ter estatura abaixo do normal não faz dela uma criança (!). O sufixo nesse caso pode sugerir infantilização, por isso não é adequado para fazer referência a quem apresenta nanismo.

De qualquer forma, a grande predileção pelo uso do sufixo “-inho” é tipicamente brasileira. Faça um teste consigo mesmo: anote quantos “diminutivos” (palavras em geral terminadas em “-inho”, independentemente de sua classe gramatical) você diz em um dia.

As pessoas costumam fazer uma pausa no trabalho para tomar… um cafezinho.  Um pedido (de qualquer natureza) geralmente vem acompanhado de um diminutivo (Você me faria um favorzinho? Você tem um minutinho? Tenho um trabalhinho para você!), provavelmente para amenizar a tarefa ou dar a entender que se trata de algo simples – é um diminutivo “encorajador”.

Quando a ideia é sugerir aconchego, logo vem o sufixo, que vai se juntando a substantivos, adjetivos ou advérbios (Vou preparar um jantarzinho para você! Ela é tão meiguinha! Fique aqui pertinho!).

Nem sempre, porém, o diminutivo carrega esse sentido positivo. Há situações em que assume carga pejorativa: “Sujeitinho atrevido aquele!”, “Tipinho à toa!”, “Mal-educado é a vovozinha!” etc.

Voltaremos ao tema mais para a frente. Por hoje, vamos comemorar. Feliz Natal a todos!

Comentários

  1. Excelente texto. À luz natalina (sem trocadilho), nada melhor do que uma boa explicação filológica para ressaltar o valor de nossa língua e nosso bom velhinho!

  2. Boa tarde, professora Thaís, tudo bem? Admiro o seu trabalho; recentemente, comprei um livro de sua autoria. Diga ao professor Pasquale que sinto muita falta dele na Rádio Cultura e pergunte-lhe quando ele voltará. Abraços a ele e a você.

    ISMAEL – JATAIZINHO – PR

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