“Varia” ou “vareia”?

Thaís Nicoleti

O verbo é “variar”, com “i”, portanto… você já sabe: alguma coisa varia. Essa é a forma reconhecida no padrão culto da linguagem. É fato que, em alguns registros orais da língua, vamos ouvir a forma “vareia”, que já foi até bordão de personagem humorístico. Quem precisa usar a língua na variante formal diz (e escreve) “varia”.

Esse caso é semelhante ao do verbo “vadiar” (eu vadio, tu vadias, ele vadia, nós vadiamos, vós vadiais, eles vadiam), cuja variante oral está bem registrada nas vozes de Clara Nunes e Clementina de Jesus no samba “Não vadeia”, de Candeia

Não vadeia, Clementina
Fui feita pra vadiar
Não vadeia, Clementina
Fui feita pra vadiar, eu vou…

Vou vadiar, vou vadiar, vou vadiar, eu vou
Vou vadiar, vou vadiar, vou vadiar, eu vou

Energia nuclear
O homem subiu à Lua
É o que se ouve falar
Mas a fome continua

É o progresso, tia Clementina
Trouxe tanta confusão
Um litro de gasolina
Por cem gramas de feijão

Não vadeia, Clementina
Fui feita pra vadiar
Não vadeia, Clementina
Fui feita pra vadiar, eu vou…

Vou vadiar, vou vadiar, vou vadiar, eu vou
Vou vadiar, vou vadiar, vou vadiar, eu vou

Cadê o cantar dos passarinhos
Ar puro não encontro mais não
É o preço que o progresso
Paga com a poluição

O homem é civilizado
A sociedade é que faz sua imagem
Mas tem muito diplomado
Que é pior do que selvagem.

Quer saber mais sobre Clementina de Jesus? Veja o blog “Eu canto samba” [http://cantorasueligushi.blogspot.com.br/2011/02/clementina-de-jesus-feita-pra-vadiar.html].

Note que existe o verbo “vadear”, terminado em “-ear” (vadeio, vadeias, vadeia, vadeamos, vadeais, vadeiam). “Vadear”, de origem espanhola, significa “passar a vau” , ou seja, atravessar a pé ou a cavalo (a parte rasa de um rio ou lagoa). Dizemos, por exemplo, que alguém vadeia um rio, isto é, a pessoa atravessa o rio a pé (ou a cavalo).

“Vadiar”, no entanto, verbo terminado em “-iar” (vadio, vadias, vadia, vadiamos, vadiais, vadiam), quer dizer “andar à toa, passear” ou mesmo “viver na ociosidade, sem trabalhar”. Também se usa o termo com sinônimo de “divertir-se, brincar, entreter-se com jogos, brincadeiras, passatempos”.  Na Bahia, é  usado no sentido de “jogar capoeira”. No Nordeste como um todo, costuma ser empregado no sentido de “ter relação sexual com alguém”. No candomblé, significa “dançar segundo o rito”, segundo informação do dicionário Houaiss.

 

 

 

Comentários

  1. “Tocar na banda/ prá ganhar o quê?/duas mariolas e um cigarro Iolanda// num relógio é quatro e vinte/no outro é quatro e meia/e de um relógio pra outro, menino/ a hora “vareia”./// (Adoniram Barbosa)

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