Drummond, Portinari e Cervantes na ponta das sapatilhas
Nada mais instigante que o encontro e o entrelaçamento de diferentes linguagens artísticas. É isso o que os amantes da arte, em suas mais variadas manifestações, podem degustar no espetáculo “O Sonho de D. Quixote”, balé levado ao palco pela São Paulo Companhia de Dança, em versão do clássico criada por Márcia Haydée.
Em cena, a par de um corpo de bailarinos cada vez mais amadurecido, que, para além de dançar, aceita o desafio da linguagem teatral, expressa em gestos e fisionomia, estão reproduções dos belíssimos desenhos feitos por Candido Portinari em 1955/56, baseados no “Dom Quixote de La Mancha”, de Cervantes.
Não bastasse isso, compõem o espetáculo versos que Carlos Drummond de Andrade criou em 1972 com base nesses mesmos desenhos, publicados no ano seguinte no álbum “D. Quixote, Cervantes, Portinari, Drummond” e posteriormente revistos para publicação no volume “As Impurezas do Branco”, reeditado pela Companhia das Letras em 2012.
A tradicional música de Ludwig Minkus (1826-1917) ganhou, na versão de Haydée, o violão (espetacular) de Norberto Macedo (1939-2011), em composições inspiradas em Portinari e Drummond.
Soneto da Loucura – Carlos Drummond de Andrade
A minha casa pobre é rica de quimera
e se vou sem destino a trovejar espantos,
meu nome há de romper as mais nevoentas eras
tal qual Pentapolim, o rei dos Garamantas.
Rola em minha cabeça o tropel de batalhas
jamais vistas no chão ou no mar ou no inferno.
Se da escura cozinha escapa o cheiro de alho,
o que nele recolho é o olor da glória eterna.
Donzelas a salvar, há milhares na Terra
e eu parto em meu rocim, corisco, espada, grito,
o torto endireitando, herói de seda e ferro,
e não durmo, abrasado, e janto apenas nuvens,
na férvida obsessão de que enfim a bendita
Idade de Ouro e Sol baixe lá das alturas.
Haverá sessão extra do espetáculo no próximo sábado, 21/11/15, às 15h00.
A Professora Thaís sempre nos brinda com trabalhs dessa natureza.