“Grafites e murais são sempre bem-vindos quando autorizados”

Thaís Nicoleti

O título acima é a última frase da nota enviada à Folha pela Prefeitura de São Paulo, na qual a administração se propõe justificar a “limpeza” dos grafites da avenida 23 de Maio, ora substituídos por tinta cinza.portugues na rua (1)

Segundo o grafiteiro Enivo, a ação da prefeitura contraria o slogan do prefeito: “Se ele quer uma cidade linda, por que pintar tudo de cinza? O prefeito anunciou uma guerra contra a pichação, mas apagou os grafites. É uma contradição”.

Pode ser uma contradição ou pode ser uma questão de gosto. Talvez o prefeito ache mais bonita uma cidade cinza ou simplesmente talvez ele não aprecie o grafite como manifestação artística.

A contradição, no entanto, certamente está nos dizeres da nota: afinal, como conciliar o advérbio “sempre”, que indica permanência, com a oração “quando autorizados”, que indica uma circunstância restrita de tempo (ou mesmo uma condição)?

Os grafites são sempre bem-vindos ou os grafites são bem-vindos quando autorizados –não as duas coisas ao mesmo tempo.

A primeira parte do período é só simpatia (grafites são sempre bem-vindos), mas a segunda desmancha a primeira (bem-vindos desde que “autorizados”). É o velho malabarismo de dizer sem dizer ou de dizer uma coisa querendo dizer outra.

É por essas e por outras distorções que palavras de políticos, assim como as imagens produzidas em gabinetes e os exercícios de pirotecnia midiática, valem muito pouco.

Administrar uma cidade como São Paulo, com todas as suas tensões, é por certo muito mais complicado do que gerenciar a própria casa, onde imperam as próprias regras e o próprio gosto. A falta de sensibilidade não costuma dar bons frutos.

 

Comentários

  1. Que alguém possua uma disformidade da alma em achar que o grafite é belo, é compreensível. O desequilíbrio patológico é algo cada vez mais comum em nossa sociedade. No entanto, querer impor isso a outrem transforma-se em agressão. Ninguém é obrigado a conviver com a imposição de rabiscos considerados pelos seus autores como “arte”. Um conselho aos pseudos artistas: rabisque, grafite, faça o que quiser em seu próprio espaço de convivência, em seu quarto, sua sala, sua casa. Não imponha aos outros, contrariando a vontade alheia, a desordem estética que os outros rejeitam.

  2. O período construído pela Prefeitura talvez ficasse melhor assim: Se autorizados, os grafites e murais serão sempre bem-vindos”. A conjunção temporal “quando” não ficou bem empregada nessa oração que exprime essencialmente um sentido condicional. “Sempre serão bem-vindos os grafites autorizados”. Foi isso o que a Prefeitura quis comunicar à população de São Paulo. A colocação do advérbio “sempre” pareceu-me sem problemas.

  3. Depende. Mesmo autorizado, nem todo grafite é bonito e nem todo lugar deveria ser usado para “grafitar”.

  4. De fato, há esse choque de ideias; porém, o anúncio tem o lado temporal explícito, ou seja: após autorizados, os grafites serão sempre bem-vindos. Aí, desaparece o sentido adversativo implícito inicialmente.

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